sexta-feira, 15 de abril de 2011

Quinquilharias...


  Cresci ouvindo meu avô Zeca, contando histórias de coisas que descobria no sótão de sua casa em Portugal, quando êle era criança. Eu e minhas irmãs, deitávamos em sua rede depois do jantar e nos deliciávamos com suas peripécias. Vô Zeca possuia o dom da palavra escrita e da falada. Suas descrições possuiam um colorido tão forte que até hoje consigo imaginar as paisagens que descrevia.

  Segundo meu Vô, no sótão de sua casa existiam baús de sua mãe, onde eram guardados coisas da família dela. Quinquilharias... era a palavra que êle usava. Então... eu cresci fascinada por quinquilharias...e sótão!

  Imaginava um dia ter uma casa num bosque...com sótão! Neste lugar guardaria, num baú, coisas de minha família! achava tão lindo e misterioso esse lugar mágico!
O tempo passou e não consegui morar em uma casa num bosque e com sótão. Em compensação consegui acumular QUINQUILHARIAS!!!! que guardo num quartinho bagunçado.

  Muitas pessoas dão palpite para eu me desfazer! que não tem valor nenhum... Para não criar polêmica, eu apenas sorrio e digo que quando tiver tempo vou dar uma arrumada.
Mas...Quando estou disposta a retornar no tempo, eu abro alguma caixa (meus baús) e trago para perto de mim, pessoas significativas que não vejo há longo tempo ou que já se foram para sempre. Minhas quinquilharias são tesouros de afeto!

  Eu vejo por exemplo um colar de continhas de vitrilho -feitas por uma paciente do hospital psiquiátrico - após um longo período de tratamento com medicação "pesada", que a deixava des-motivada e sem coordenação motora para fazer qualquer coisa. Recordo sua dificuldade em enfiar a linha de nylon nas continhas e o tempo que levou para concluí-lo. Após cada tentativa bem sucedida, ela me olhava e sorria. Eu a elogiava e motivava. Um dia ela concluiu o colar e me pediu para ajudá-la a colocar o fecho.
 Está lindo!!! você pode dar de presente para alguém que você gosta! - falei
Eu fiz pensando numa pessoa que gosto muito!- respondeu-me cabisbaixa.

  Depois do horário do lanche dos pacientes, eu estava lendo, quando senti alguém se encostando nas minhas costas e colocando algo em meu pescoço. No início me assustei, afinal estava num hospital psiquiátrico! mas ao vê-la e perceber o que circundava meu pescoço, compreendi. O presente foi colocado em silêncio e eu beijei suas mãos, em agradecimento. Nada de palavras! ela se foi e eu usei o presente durante um longo tempo. Ela olhava e sorria. E fazia outros colares para dar de presente para as pessoas que ela amava.
 
  Dentro das minhas quinquilharias também tem o primeiro presente escolhido e comprado pela minha filha mais velha. Ela tinha quatro anos (hoje ela tem 37 anos) e queria me dar um presente no Dia das Mães, comprado por ela. Além do que havia "confeccionado" na sua escola.Fomos a uma loja e ela se encantou com um bracelete de plástico dourado! me perguntou se eu gostava dele.Diante de minha afirmativa, perguntou à vendedora (que estava encantada com aquela loirinha que sabia se comunicar tão bem) quanto custava e retirou de sua bolsa o dinheiro que seu pai lhe havia dado.
Este dinheiro pode comprar este presente?
Sim, pode! respondeu a vendedora.
Então faça um presente para a mamãe.
  Nunca esqueci sua carinha de felicidade ao me dar o presente!!!

  Um dia, eu estava muito triste.Minha auto-estima lá embaixo.Havia chorado muito. Mas precisava sair para pagar algumas contas em lojas.Lembro que vestia um longuinho ("estava na moda") com estampas em cores pasteis.Entrei na loja de departamentos e um colarzinho de conchas me chamou a atenção.Tomei-o nas mãos num conflito entre comprá-lo ou não.Ouvi uma voz masculina me falando:
Aceita uma sugestão?
Ao me virar, deparei-me com dois homens muito bonitos sorrindo. Um deles se dirigia a mim.
Aceite! sereias combinam com conchas!
Era um galanteio original e educado. Não pude deixar de sorrir.Ele continuou:
Depois dizem que em Manaus não tem mulher bonita! as sereias andam nas ruas!!!
Agradeci a "dica" e comprei o colar. Não é preciso dizer que aquele simpático elogio me fez muito bem naquele momento. Ele (o colar de conchas) está entre as minhas quinquilharias!!!

  Para mim, cada coisinha tem sua história, seu momento de encantamento e magia.É uma passagem da nave do tempo.E a sensação de chegada é a mesma de que quando os fatos passados ocorreram.
Então, "decoradores de plantão", me poupem com suas sugestões descabidas pois as boas recordações são os melhores investimentos que fazemos na vida!
Viva!!! sótões e quinquilharias!!!

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